

AH, OS AMIGOS...


por

Pedro Gonzaga – narrador
Pedro Henrique Springer da Silva – Sir Quevim
Ricardo Cabral da Silva – Sir Shabaka
Cardoso – Getrudes, a donzela
Debaixo de um sol infernal, dois cavaleiros preparavam-se para o duelo. Amigos de longa data, sorriam cordialmente um para o outro. A arquibancada estava cheia. Na parte central estava sentada a donzela mais formosa do reino. Sir Quevim estava vestido de negro e Sir Shabaka, a sua direita, trajava uma armadura prateada. Sir Quevim falou:
– Meu amigo, não queria ter que lutar com você. Vamos fazer de conta?
– Sim, claro. Mas vamos fingir um duelo violento, para o publico. Depois dividimos o prêmio. O que você acha? Afinal, estamos endividados mesmos. E depois, só sobramos nos dois, de todos os outro cavaleiros neste torneio.
– Boa idéia! Vamos lá! Quem começa atacando?
– Bem, você sabe que agora é a hora dos martelos e escudos. Você dá um golpe por cima, eu desvio. Ok? Putz, mas como está calor dentro desta armadura. Você viu quem está na arquibancada real?
Da platéia, a donzela acenou efusivamente com seu lenço cor de rosa primeiro para um e depois para o outro. Os dois amigos se olharam surpresos e embasbacados. Sir Quevim disse:
– Mas ela te conhece também?
– Claro! Estamos juntos e ela me jurou fidelidade e amor eterno. Lembra? Essa é aquela garota que eu te falava!
– É estranho... Ela me prometeu a mesma coisa!
– Ah, é, seu vagabundo? Você vai sentir o peso da machadinha abrindo essa sua armadura negra!
– Então sentirás a minha encravada em sua testa!
As armas começaram a se chocar. O som dos metais contra os escudos era apavorante. A donzela, desesperada com o que via na arena, levantou-se de um salto e se lançou arquibancada abaixo em direção aos dois. Aos gritos, ela disse:
– Pelamordedeus, não me façam uma coisa dessas!
– Estou lutando por você, Gertrudes, meu amor!
– Shabinha, meu lindo, não vale a pena derramar sangue por uma mulher como eu!
– Sim! O sangue dele não vale a pena ser derramado – disse Sir Quevim – um sangue podre desses não vale a pena...
– Cala a boca, seu degenerado, filho de uma ratazana! Vou cortar tua orelha com minha espada.
– Oh! Nobres cavaleiros! Não deixem que a raiva fale mais alto que vossos corações!
– Meu coração bate muito forte, e por você, Gertrude querida! – brada Sir Quevim.
– Oh!
– Cala boca com essas baboseiras de amor! Vamos à luta. Quero atravessar logo minha espada em você! – ameaça Sir Shabaka.
– Oh!
– Prepare-se para a morte, então!
Um distinto cavaleiro se ergueu de seu lugar e gritou a plenos pulmões: Gertrudes, luz da minha vida, volta pra cá e deixa esses dois aí. Estou saudoso do calor dos seus lábios. Os dois amigos, que haviam se esquecido desse fato se olharam:
– Mas o que? – disseram, ao mesmo tempo.
– O que aquele cavaleiro está a lhe dizer, Gertrudes, meu amor? – espantou-se Sir Shabaka.
– Como? Três ao mesmo tempo, Gertrudes?
– Com ele também?
– Oh! Eu fico tão sozinha... – geme Gertrudes, a disputada donzela.
– Meus calorosos beijos não lhe foram o suficiente, nem mesmo o meu amor. Estou com o coração partido. – lamenta-se Sir Shabaka.
– Você não se sustentava só comigo, então não pouparei mais sua vida cheia de traições! – urrou Sir Quevim.
– O que você quer fazer conosco, mulher enlouquecida? Isso não irá ficar assim. E pensar que estava prestes a matar meu melhor amigo... – reflete Sir Shabaka.
– Oh! Clamo pela minha vida! Será que ninguém socorrerá uma pobre e inocente donzela?
– Nunca mais quero ver teu rosto, ouvir tua voz... A morte te cairá muito bem, sua ordinária! – acusa Sir Shabaka.
– Depois dessa, ninguém se levantará para ajudá-la! Então segure esta machadada!
– AAAAAAAAAAAAH!!!
Os dois se olharam e partiram para cima dela. Golpearam-na sem piedade. A donzela ficou caída no chão, o sangue escorrendo para a areia. Os miolos esmigalhados ficavam ainda mais amarelos sob a luz do sol. Os dois cavaleiros se abraçaram e fizeram as pazes. A verdade é que o dia seguia igual a antes do trágico combate. Menos, é claro, para o pessoal da limpeza. Remover os restos de Gertrudes, a mais bela mulher do reino em duas gerações, ia ser tarefa das mais asquerosas. Ah, os amigos...