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INTRODUÇÃO

1. NEW JOURNALISM
1.1 As origens do New Journalism
1.2. Talese, Wolfe e Breslin e o surgimento do New Journalism
1.3. Capote e Mailer reforçam o time
1.4. Definições e Características

2. GONZO JOURNALISM
2.1. Hunter S. Thompson e as origens do Gonzo Journalism
2.2 O que é Gonzo Journalism?

3. GONZO JOURNALISM VS. NEW JOURNALISM
3.1. A Imersão e A Osmose
3.2. A Captação Participativa
3.3. Foco Narrativo
3.4. Sarcasmo e Sobriedade
3.5. Ficção e Não-ficção
3.6. O uso de drogas no Gonzo Journalism
3.7. A fuga do foco principal
3.8. Epígrafes, pseudônimos e ilustrações Gonzo

CONCLUSÃO

OBRAS CONSULTADAS



3. GONZO JOURNALISM
VS. NEW JOURNALISM


3.8. Epígrafes, pseudônimos e ilustrações Gonzo

Outros aspectos que praticamente inexistem entre praticantes do New Journalism e marcam presença constante nos artigos Gonzo são o uso de epígrafes, conforme já descritos no capítulo II deste trabalho, o uso de pseudônimos por parte dos seus autores e as ilustrações Gonzo. As epígrafes aparecem nos textos de muitos autores modernos, como no exemplo de Matias Maxx, autor do texto Hippie Hop Lapa: Uma Visita ao Front, publicado no site Irmandade Raoul Duke:

um dois, um dois, isto não é um teste/ você não é um b-boy só pela roupa que veste/ se você é emecee mande uma rima que preste/ grafiteiro ou pixador vai jorrar seu jet/ Hip Hop é tipo respirar um ato espontâneo/ cultura marginal, direto do subterrâneo. (Maxx, 2002)

No artigo, Matias fala sobre as suas aventuras na Hip Hop Rio, tradicional festa organizada pelo movimento hip hop do Rio de Janeiro realizada na Lapa, um dos mais tradicionais bairros boêmios da cidade. Os versos que usou de epígrafe são, na verdade, parte da letra da música Equipamento Precário, do grupo de hip hop carioca Inumanos.

Ainda na mesma edição do website, a jornalista Cecília Giannetti, uma das mais notórias representantes do Gonzo Journalism no Brasil, abre o seu A Noite é Longa e a Saia é Curta na Lapa mas o Mar não tá pra Piranha: A Lapa é o Rio em 2002 com uma frase dita por Millôr Fernandes para Madame Satã em entrevista ao Pasquim: "É do estofo de homens como você que se fazem líderes. Você se transformou em um marginal. Se você fosse alfabetizado você seria um líder." (Fernandes apud Giannetti, 2002)

Giannetti aproveita uma visita ao tradicional bar Arco-Íris, também na Lapa, para falar sobre a realidade da noite do Rio de Janeiro contemporâneo e discorrer longamente sobre a história e os personagens do bairro. No texto, Giannetti conta histórias envolvendo figuras folclóricas como o músico João Gilberto (apelidado, na época, de Zé Maconha), por exemplo, e por isso usa como epígrafe uma citação a Madame Satã, uma das mais conhecidas personagens da Lapa nos anos 60.

O site Irmandade Raoul Duke, principal veículo para o Gonzo Journalism brasileiro na internet depois do fim do COL recebeu este nome inspirado no pseudônimo utilizado por Hunter Thompson para publicar, em capítulos, a primeira versão de Fear and Loathing in Las Vegas, na Rolling Stone. É fato conhecido que Thompson também utilizasse os pseudônimos F.X. Leach e Sebastian Owl (Othitis, 1994) para escrever artigos gonzo.

Não existem explicações objetivas para os motivos que teriam levado Thompson a optar pelo uso de pseudônimos mas os Gonzo Jornalistas brasileiros o fazem muitas vezes pela necessidade de não serem diretamente associados ao Gonzo Journalism. A má reputação do gênero vem justamente da sua associação com o consumo de drogas. Muitos jornalistas preferem não ter sua imagem associada a este estigma e, portanto, preferem assinar as suas matérias com um pseudônimo. O caráter marginal do Gonzo Journalism é muito forte visto que o seu exemplo mais conhecido, muitas vezes tomado como o principal título do gênero é Fear and Loathing in Las Vegas, uma verdadeira ode ao consumo exagerado de entorpecentes e à contravenção como um todo.

A Irmandade Raoul Duke tem diversos exemplos desta prática. Para descrever uma experiência com o Santo Daime em A Libélula Azul do Falso Mexicano, por exemplo, a repórter M.R. preferiu esconder-se atrás de suas iniciais. O perfil do traficante Madureira, em Madureira, como ele gosta de ser chamado, aparece creditado simplesmente a Jajá. Um dos criadores do website, inclusive, assina toda as suas matérias com a alcunha de Suruba. Até uma tranqüila descrição de uma festa árabe com bebedeira e direito à sessão do filme Where the Buffalo Roam aparece assinada por Simbi%nte. O próprio Matias Maxx faz do seu nome verdadeiro uma incógnita.

Por fim, o Gonzo Journalism de Hunter Thompson contava ainda com mais uma característica exclusiva em relação ao New Journalism: as ilustrações de Ralph Steadman. Ainda que nem todos os seus textos fossem ilustrados pelo cartunista, sempre que havia uma ilustração nos artigo de Thompson, ela pertencia a Steadman. O principal motivo para isso é o fato do cartunista galês ter desenvolvido um estilo capaz de representar com perfeição gráfica os preceitos do Gonzo Journalism, uma espécie de ilustração Gonzo.

Em seu website pessoal*, Ralph dedica uma seção inteira à arte Gonzo, onde é possível admirar e mesmo adquirir a maioria dos desenhos que Ralph fez para as mais famosas aventuras de Thompson, com preços que variam entre US$ 125 (para a gravura de um homem-lagarto de Fear and Loathing in Las Vegas) e US$ 4.500 (para a famosa Bats over Barstow, que reproduz a cena de abertura do mesmo livro).

*http://www.ralphsteadman.com

Seu traço nervoso dá a impressão de que os desenhos foram feitos na mais absoluta pressa, cheio de hachuras e imagens confusas, o que se relaciona diretamente com a espontaneidade na escrita de Thompson. As figuras humanas são sempre anatomicamente imperfeitas e quase sempre apresentam semblantes bizarros e distorcidos, fazendo uma associação à visão deturpada pelas drogas que Thompson lançava sobre os objetos de suas reportagens. Não raramente, há borrões de tinta espalhados por toda a ilustração e riscos sobrepondo-se como que corrigindo detalhes mal resolvidos previamente.

A Irmandade Raoul Duke também dispõe de dois ilustradores inspirados pela estética de caos desenvolvida por Steadman para representar graficamente os escritos de Thompson. Luiz Pellizzari e Nelson Azevedo são estudantes da faculdade de Artes Plásticas na Universidade Federal do Rio Grande do Sul e procuram reproduzir as características mais marcantes do traço Gonzo de Steadman.

Todos os textos produzidos para a Irmandade são, necessariamente, acompanhados de ilustrações em preto-e-branco, feitas à mão, com o uso de penas à base de nankim. As ilustrações devem ser a representação visual das idéias e fatos relatadas pelo repórter no seu texto, seguindo sempre a estética propositadamente desleixada e intensa criada por Steadman.

As gravuras abaixo comparam uma ilustração feita por Steadman chamada Schlumpfen Man (figura 2A) com outra feita por Nelson Azevedo para o artigo Hippie Hop Lapa: Uma Visita ao Front, de Matias Maxx (figura 2B).

fig.2A - Schlumpfen Manfig.2B – Ilustração de Nelson Azevedo

Podemos perceber como as duas imagens apresentam características semelhantes no tratamento à anatomia humana disforme e o aspecto nervoso do traço, assim como o uso do nankim.

O próprio Steadman tem a sua definição sobre Gonzo Journalism: “Gonzo é a essência da ironia. Você não deve ousar leva-lo a sério. Você tem de rir”. (1998)

volta segue